(*) José de Anchieta Batista
Dr. Antonio Malheiro, Conselheiro do
Tribunal de Contas do Estado do Acre, é uma dessas pessoas extraordinárias. Na
alma deste valoroso técnico, mora uma criatura exemplar, um ser humano da
melhor qualidade e um grande cidadão.
Ético, solidário, humilde, intelectual, traz sempre consigo uma pronta
disposição para uma boa e agradável conversa, no além-fronteiras as coisas
técnicas e enfadonhas da maldita burocracia. Quem não o conhece identifica, sem
demora, tratar-se de um conhecedor profundo dos meandros da vida, e se vê
diante de um verdadeiro filósofo, de quem se pode absorver sempre algum novo
conhecimento.
Certo dia, concluídos os assuntos da
pauta que me levara até seu gabinete, passamos a comentar os grandes desafios
da previdência nacional, tanto do regime geral, quanto dos regimes próprios, aí
incluída a previdência dos servidores públicos acreanos.
Em certo momento, eu lhe externei a
amarga certeza que carrego comigo:
- Doutor Malheiro, o sistema
previdenciário brasileiro está falido. Os cofres estaduais e municipais não
aguentarão. Isto virou uma bomba-relógio. É um tsunami que está para chegar! Um
apocalipse!
- Mestre Anchieta... - assim me trata
ele bondosamente – Escute...
- Não se desiluda. Tudo irá para seu
lugar. Mesmo que a bomba venha a explodir, nada ficará sem solução. As crises
sempre abrem novos caminhos – falou-me pausadamente.
E continuou:
- Vamos ter esperança, mestre! Muita esperança! Vou contar-lhe uma história
que aprendi ainda criança:
Um
sujeito foi preso e colocado na masmorra, por ter sido flagrado roubando uvas
nos parreirais do reino. Os companheiros de cárcere disseram-lhe que não se
livraria da morte. Em casos idênticos, ninguém tivera destino diferente.
-
Prepare-se, amigo, você será enforcado! – todos lhe afirmavam.
Quando,
dias depois, foi conduzido à presença de sua alteza real, confirmou-se a
sentença: Pena de morte! - A execução seria dali a sete dias.
O
sujeito, porém, parecia estar muito em paz. Não demonstrava preocupação com seu
anunciado enforcamento, o que causava enorme espanto aos companheiros de
prisão.
- Cara, você é doido? Você vai morrer e parece
que nada está acontecendo! - alertavam-no os demais encarcerados
Em
resposta, o sujeito passava o tempo todo
tocando uma gaita, assobiando e cantando modinhas, como se a morte decretada
não fosse a dele.
No
dia seguinte, o vigário do reino, após o sacramento da confissão, conseguiu-lhe
uma audiência com o rei, a fim de lhe suplicar clemência.
-
Meu amado Rei! Vossa Poderosa e Augusta Majestade poderá ter o reinado mais
famoso da Terra. Estou ensinando meu macaco a falar. Preciso de um ano para
deixá-lo pronto para conversar. E quando isto acontecer, Vossa Majestade vai
recebê-lo como presente deste seu humilde súdito.
O
rei ficou impressionado com aquilo e depois de fazer-lhe algumas perguntas,
sentenciou:
-
A partir de hoje você está em liberdade e lhe será concedido um ano para que
seu macaco fale. Passado esse tempo, se o macaco não falar, forca!
O
sujeito saiu dali aos pulos, correndo em círculos, numa alegria sem fim,
gargalhando, sorrindo, gritando para todo mundo:
-
Viva! Viva! O Senhor meu Rei me livrou da forca! Estou livre! Viva meu macaco!
Viva!
Seus
amigos o interpelaram, diante de tamanha euforia:
-
Como é isso, cara? Você, de qualquer
forma, vai morrer daqui a um ano... Por que toda essa comemoração?
-
Por acaso, vocês sabem o que significa um ano para mim? – gritou exultante,
para em seguida se explicar:
-
Durante um ano, meus amigos, o rei pode morrer... eu posso morrer... o macaco pode morrer... o mundo pode se
acabar... tudo pode acontecer!
E
arrematou:
-
Pode até ser que, durante esse tempo, eu consiga fazer o macaco falar!
Gargalhou mais uma vez, acendeu um cigarro,
deu uma gostosa baforada... e dobrou a esquina assobiando, todo prosa, agarrado
à inabalável certeza de que a esperança é mesmo a última que morre.
- Obrigado, Dr. Malheiro. Rezemos para
que nosso gorila previdenciário brasileiro não demore a falar.
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