(*) José de Anchieta Batista
Minha atual sensação é a de que me tornei
idoso sem me tornar aquele velho em desuso, fora de validade, ou simplesmente
deslocado para algum recanto, a fim de não atrapalhar o caminho. Sei que é melhor
não insistir nas mesmices. Melhor medir as atitudes para não parecer, em certos
momentos, um velhote que quer parecer um adolescente. Tudo tem que ser muito
natural. Assim, não seremos nem velho nem jovem, mas um ser humano investido de
suas potencialidades do momento. Sou esse cara. Não posso mais fazer uma
corrida de dez quilômetros, nem posso mais praticar o pentatlo militar, mas
continuo sendo o Anchieta. E a vida continua bela.
Abandonei aquela satisfação de estar buscando
assuntos polêmicos para cutucar os outros, mas continuo com minha varinha de
ferrão funcionando. Já não discuto tanto sobre futebol, salvo se o Vasco da
Gama estiver sendo vilipendiado por algum rubro-negro.
No que tange a religiões, realmente não as coloco
em pauta. Não as discuto, mesmo. Quem quiser adorar um cabo de vassoura, defendo
esse direito e exijo que isso seja respeitado. Ante a convicção de que o que
chamam de Deus compreende o micro e o macro, sem lacunas ou reticências,
convenci-me de que todos somos absolutamente ignorantes a respeito deste Ser
Supremo a que deram traços e atitudes humanas. Deus, na forma como o propagam,
é simplesmente uma invenção humana. Afinal, somos todos um bando de bestas que se
atribuiu o poder e o direito de criar, a seu modo, o próprio criador.
A origem de tudo? Calma, amigo. Ninguém sabe,
nem nunca soube e, provavelmente, nunca saberá. O que existem são histórias
fantásticas. Escute bem: Ninguém, dentre esses comedores de feijão que conheço,
consegue delimitar e esclarecer os mistérios circundados pela vida e pela
morte. Ninguém consegue identificar exatamente onde termina uma e onde começa a
outra. Isso simplesmente não existe porque tudo é uma coisa só. A vida está na
morte e a morte está na vida. O detalhe disso? Desculpa, não sei!
Não entremos em discussão. Realmente de nada
sabemos.
Melhor não tentar alcançar o inalcançável.
Findaremos criando, como já o fizeram, uma fantasia própria, transformando-a em
verdade insofismável e a ela nos submetendo como regra de vida, embora falsa.
Desejo recordar algo de nossas vidas.
Lembram-se das discórdias em nossos “achismos”? Crescemos sob alertas
cotidianos de que “religião, política e futebol, não se discute”. Besteira.
Passamos a vida inteira discutindo essas e muitas outras predileções pessoais,
sem observar esse preceito. Nada nos levou a lugar nenhum. Só a sabedoria é que
termina nos convencendo.
Bem, ficou claro acima que, por uma opção própria,
ou amadurecimento - não sei -, já não me fascina aquela euforia em discutir se
o melhor é o Flamengo ou o Vasco, ou se o gol mais bonito da rodada foi esse ou
aquele. Ficou para trás o tempo em que eu me achava o máximo, declarando-me um
ateu. Já não me anima discutir obras literárias, nem concordar ou discordar de
qualquer estilo que seja opção de alguém. O mundo não é meu e cada um que ocupe
a janela que quiser e puder ocupar. O restante, dane-se!
Pelo amor de Deus! Quase esqueci de abordar aqui,
neste contexto, um dos assuntos sobre o qual se recomenda veementemente não
discutir sobre nossa forma de vê-la: A POLÍTICA!
Seria ótimo que eu tivesse disposição e condições
de discutir este assunto tão valoroso. Seria de grande importância se seus princípios
basilares fossem realmente seguidos. Mas tem sido um mero ritual para dar “pão
e circo” ao povo. Esta “porcaria”, que dizem tratar-se de uma Ciência, não me
traz agora na velhice prazer algum em qualquer discussão. O que sinto por ela é
repugnância. Assisti durante a vida inteira a um permanente desfile de coisas e
regras criadas pelos humanos, sempre com vantagens voltadas para aqueles que as
inventam. Venho do tempo de Getúlio Vargas. Alguém pode me garantir que as
coisas tenham mudado substancialmente?
Pobre humanidade.
Quando os homens conseguem se libertar das
tiranias e buscam compor democraticamente seus próprios governos, sempre,
sempre, nasce do âmago de si próprios uma maldita impostora chamada POLITICAGEM,
com um caminho traçado para os desmandos e para a corrupção. A escadaria do
poder possui sempre o mesmo traçado e o mesmo jeito de acontecer. Sem fedentina,
lá não se chega. É a regra atual. Esse monstro é forjado no egoísmo, na
ganância desenfreada, nos interesses pessoais e noutras mazelas que fazem do
ser humano uma criatura odiosa e desagregadora.
No Brasil, os governos se sucederam historicamente até os dias atuais,
com seus roteiros e suas próprias desgraças. Ocorre que a maldita politicagem vem
acompanhando tudo, obedecendo seu próprio regulamento de perpetuação.
E nosso povo? Sem muita discussão, com seus
fardos de esperanças, continua à beira do caminho, no aguardo de que o trem da
liberdade venha acolhê-lo em algum alvorecer.
(*) Professor, poeta e escritor
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