sábado, 24 de março de 2018

UM BALANÇO DA VIDA


José de Anchieta Batista
 De repente cheguei aos setenta e três anos, com uma bagagem enorme de erros e acertos. Tudo continua confuso e incerto. Também profissional da Contabilidade, estou me dando ao trabalho de fazer os meus balanços. Fico, porém, bastante triste quando vejo que as contas nunca fecham.
Sobre o transcorrer da vida, creiam os mais novos: tudo passa num relâmpago. Anteontem eu era um menino... ontem eu era um jovem cheio de vida... hoje sou um idoso buscando viver.
Tentar não se ver, e também não ser visto, como uma enxada velha e carcomida, lá num recanto de parede, é bem difícil. Estou reagindo a isto. E é mais que necessário reagir. É um ato de sobrevivência na prorrogação da vida por mais algum tempo. A velhice tem uma espécie de ferrugem que finda nos levando a uma depreciação pouco remediável. Se nos conformamos com isto e não nos valemos de algum anticorrosivo, bem mais ligeiro chega, a nossa porta, aquele automovelzinho tenebroso, com enfeites em cor lilás, pertencente a alguma casa funerária.
É, meus amigos. Vamos viver! Estrebuchemos! Lutemos e vivamos, embora algum dia o fatídico momento tenha que acontecer. É inexorável. Não adianta choramingar. De repente aquela maldita “carrocinha” parará defronte nossa casa, nos recolherá como uma encomenda, nos levará num cortejo para habitar um bairro macabro onde ninguém quer morar. Superficialmente é isto, embora exista, para mim, algo maior acontecendo paralelamente.
Refletir sobre estas coisas é como algo que sempre nos faz desmoronar. A certeza é absoluta, mas todos fugimos dela.  É que ninguém consegue se preparar para receber a inevitável, porém sempre indesejada visita.
De minha parte estou tentando amenizar este encontro.
Hoje iniciei o dia relendo e mastigando o que nos diz o nosso querido e extraordinário Mário Quintana, sobre o lapso da vida:

SEISCENTOS E SESSENTA E SEIS (O TEMPO)
Mário Quintana
A vida é uns deveres que nós trouxemos
para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6ª-feira…
Quando se vê, passaram 60 anos…
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra
oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre, sempre em frente…
E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.
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