José de Anchieta Batista
Sempre encontro
alguém que se diz versado em Deus, em Jesus, nas verdades do Céu. Silenciosamente,
mas de forma fraternal, dirijo-lhe aquela frase muito usada hoje em dia, quando
discordamos de algo: Sabe de nada,
inocente!
Defendo a
existência das religiões. Também pratico uma delas. São úteis e necessárias,
ante a necessidade que o homem traz consigo de cultuar o “sagrado”. Precisamos
crer em algo acima de nossa pequeneza. Contudo, este verbo crer, muito
vinculado à fé, pode representar um caminho para ser manietado por outros. São
as crenças impostas, a que denomino “pratos feitos”. E aí entra de tudo,
principalmente o pavoroso medo de passar a eternidade no inferno. Huberto
Rohden, espiritualista brasileiro, afirma que “ninguém crê no que quer; crê no que pode crer”. Em sã consciência,
aí está o limite do tamanho da fé. O resto é mera fantasia ou produto da imposição
psicológica do “prato feito”. Fica por conta de cada um de nós, os acréscimos de
limites a nossa capacidade pessoal de crer.
Concluído este
introito, aventuro-me por outra abordagem, dentro do mesmo contexto. É que já
não me contento com algumas “verdades” milenares que nos foram trazidas pela
ignorância e pela inocência de nossos ancestrais. Tenho consciência de que, na
amplidão deste maravilhoso Universo, repleto de enigmas, somos meras crianças.
Contudo, já não cabe mais, em pleno século XXI, explicar as nossas incógnitas
por meio de historinhas assemelhadas às fábulas de La Fontaine.
Realmente somos pequeninos
diante da magnitude de tudo o que existe. Somos como crianças procurando
avançar no entendimento. Lembro-me
nitidamente de que, quando eu era menino, dentre muitos outros pensares de meu
mundo fantasioso, acreditava que os urubus faziam seus ninhos dentro das nuvens;
tinha certeza de que os trovões e relâmpagos eram a forma de Deus expressar sua
ira contra os homens, e tinha raiva de Papai Noel pelos presentes que não me
dava. Seu Batista, além de meu pai e guardião, era para mim, com suas
concepções rudimentares, o sábio que buscava desvendar todos os mistérios,
diante das inumeráveis incógnitas e pavores que me cercavam.
Pela vida afora,
muito busquei entender o confronto entre a Ciência e a Religião. O que sei é
que, historicamente, quando a ciência traz à tona uma verdade verdadeira, a
religião recua, muda ou adapta seus equivocados ditames. Assim, as descobertas
científicas vão expurgando interrogações e nos trazendo a certeza de que, dali
por diante, aqueles fenômenos, ou nossas maneiras equivocadas de ver ou sentir,
passam a ter uma outra cara: a indiscutível cara da verdade. Assim tem sido a
Ciência, corrigindo as crenças, mudando os rumos da vida e desvendando os
aparentes mistérios intrínsecos e extrínsecos de cada coisa.
Quando o Criador, da
maneira como cada um O conceba, seja lá como Ele realmente for, explodiu o nada
e fez nascer a infinita essência do tudo, imprimiu também, nos recônditos desse
tudo, mistérios dificilmente atingíveis e desvendáveis pela pequenez dos deuses
diminutos que também criou. Esses pequeninos deuses somos nós, os homens. Em meio
a tudo isso, vagamos, inocentes e ignorantes, sem a ideia de nossa origem, sem a
razão de nosso existir, sem ter consciência de para onde caminhamos. Nesta
enorme confusão, sempre surgem os “iluminados” que se outorgam o conhecimento
de tudo. É aí que nossa modesta sensatez nos grita: Sabe de nada, inocente!
Hoje,
septuagenário que já sou, olho para o mundo e me vejo ainda subindo o primeiro
degrau de uma infinita escadaria. Meus cabelos brancos não representam muito no
trilhar do saber, nem meu corpo físico, já fatigado pelo passar dos anos, conduz
em si a propalada sabedoria do ancião. Sinto-me uma tenra criatura, frágil e
ignorante, sempre ouvindo de mim mesmo: Sabe
de nada, inocente!
Mesmo assim, pude
alcançar que tudo é energia! E o Criador é a Suprema Energia Originária que
movimenta tudo e manifesta o constante milagre da vida. Estou convencido de que,
se antes nada existia, tudo o que compõe o Universo veio dessa Força Maior. Por
isso, cada partícula a Ele está ligada. As leis que regem e movimentam todos os
sistemas existenciais, embora eu desconheça seus princípios e regras, são por
Ele comandadas. Não pode ser diferente. É algo bem acima do teto de meu
entendimento, algo infinitamente colossal, que me obriga encolher-me num
recanto de mim mesmo, para ouvir um grito ensurdecedor: Sabe de nada, inocente!
Aos poucos, e
através dos milênios, a Ciência vem cuidando de retirar os véus de nossa
ignorância. Parece até que o Criador deu
existência a esta coisa caórdica, mas guardou consigo as minúcias e as equações
de enésimas incógnitas, para ocupar os cientistas em desvendá-las, num processo
que nunca chegará ao fim.
Naquele momento,
deve ter pronunciado em seu íntimo:
- Eis aí os
grandes enigmas da existência. Encontrem-me neles! Eu estou em cada partícula!
Para encontrar
Deus, as religiões foram sendo forjadas pelo homem. Multiplicaram-se, com suas variações e
adaptações, por todos os recantos da Terra, muitas delas navegando entre o
absurdo e o razoável, entre o amor e o ódio, entre o bem e o mal, pregando a
fraternidade, mas promovendo a destruição do semelhante. Enquanto isso, a
Ciência teve que caminhar paralelamente para clarificar as “verdades aparentes”
e os dogmas sem fundamento. Muitos e muitos morreram nas fogueiras, por se
contraporem a concepções mentirosas impostas em nome de Deus. E isso não mudou
muito. Neste aspecto, o mundo moderno continua quase na pré-história. Aqueles
verdadeiros mártires buscavam, mesmo sem terem consciência disso, o caminho das
supremas verdades do Criador. Pena que muitas descobertas foram direcionadas
para a prática do mal.
Concluo neste
momento, pequenino que sou, ouvindo algo estridente que em mim ecoa:
- Sabe de
nada, inocente!
Ah! Quase me
esqueço de emitir uma última opinião, colhida na insignificância de meu modesto
mundo:
- A Ciência é a verdadeira Religião de Deus!
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