domingo, 8 de janeiro de 2017

UM MONÓLOGO, QUASE ORAÇÃO

Ó Deus!
Com certeza existes muito além das ilusões que estão por aí;
Ou melhor, das futilidades que estão por aqui.
Não te quero adquirido das prateleiras religiosas! Não, não quero.
Ali, és artesanal, és imperfeito, és feio, és macabro!
Pois é. Ali, deturpam-te todo e ainda conseguem dizer-te Perfeito, Boníssimo, Amor e Luz!
Foi assim que me fizeram o ateu que eu não sou!
Não te creio aquilo!

Ó Deus!
Creio-te tão grande no microcosmo, quão simples no que é infinitamente grande.
E eu, na minha significância tão insignificante, me contorço nesta amplidão feita de tempo e de espaço ...
Com certeza aqui estou, ó “Razão Primária de Tudo”, por algum salutar motivo. Não talvez por ser tão pequenino, mas por ser acólito irrefreável de minha própria rebeldia.  Mesmo assim, diante de tudo, não me sinto teu prisioneiro, mas prisioneiro de mim mesmo. Na verdade, estão grudadas em mim, as minhas asas para voar; Sei que as tenho, sinto-as, mas não consigo desprendê-las!

Ó Deus!
Fervem mistérios em minh’alma. Minha evolução adormecida parece despertar. E eu vago como um sonâmbulo ...  Tateio paredes, quero dizer versos ... restam-me grunhidos. Já não sei a diferença entre o pesadelo e o sonho.  
Tudo bem! O que importa isso?
Não! Não quero mais sonhar. Quero realizar, quero fazer, porque também sou Deus ...  Quero voltar das margens para o centro, donde me afastei para encontrar estes malditos grilhões.
E eu tenho pressa, pois o tempo, que é tão nosso, passa! E como tantos outros ignorantes e desnorteados, às vezes lanço meu tempo no desperdício, buscando-te nos burburinhos indecifráveis que me ensurdecem e me confundem, dentro deste labirinto em que me perdi.

Ó Deus!
Sempre que te busco nas religiões, sinto-me um órfão, um infeliz, uma simples interrogação irrespondível. Sinto-me no Coliseu da velha Roma ...  E ali:
- sou o impiedoso César que se deleita!
– sou o leão faminto e enfurecido!
- sou o Cristão à espera de um milagre!
E ainda consigo ver-te assistindo a toda a barbárie, alheio, insensível,  como se nada te tocasse.
É neste momento que me revolto e te pergunto agressivamente:  Que Deus és tu?

Ó Deus!
Por vezes, 
lá estou eu lustrando as pedras da coroa de Herodes; 
lá estou eu com João Batista, em meio ao deserto, jogando conversa fora, num banquete de mel com gafanhoto; 
lá estou eu vendendo bodes, pombos e bugigangas, no templo de Jerusalém ...
Por vezes,
lá estou eu a segurar a bacia de Pilatos e até mesmo a lhe enxugar as mãos...
E minhas mãos? Sim! Aquelas mesmas mãos que bateram palmas em apoio a Caifás ... que acenaram por Barrabás ... que fugiram de enxugar a fronte do Messias ... são as mesmas que agora empunham e manejam a lança do centurião.

Ó Deus!
Tudo isso me faz quase um deserto insuportável! Não estás aqui, mas estás em tudo ...  Estás em tudo, mas não estás aqui. É como se existisses, sem existir.
Apesar de tudo, fica em mim uma certeza: - tu não és nada disso que me oferecem! E se eu não te fizer nascer em mim, grande como verdadeiramente és, continuarás sendo esta ilusão absurda, perversa, inconcebível e inexplicável. Não te quero assim!

Ó Deus!
Tu estás em mim e eu em Ti! Somos UM!
Basta de minha pequenez! Dá-me o caminho de volta!
Busquei a cegueira! – abre-me os olhos!
Tornei-me surdo! – abre-me os ouvidos!
Caminhei para a escuridão! – ilumina-me!
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