segunda-feira, 29 de maio de 2017

JOIAS DO GIÓIA

Rafael GIÓIA JUNIOR nasceu no dia 9/8/31, em Campinas/SP. Foi escritor. poeta, radialista, jornalista, advogado e político. Faleceu em 3 de março de 1996.
Dele, aqui transcrevemos dois poemas.
No primeiro, ele descreve de forma muito atual, num mundo de violência desmedida e irrefreável, a ansiedade de quem aguarda em casa, madrugada adentro, o doce barulho da maçaneta, anunciando o retorno do filho querido. O segundo poema retrata a desgraça que o "poder", ou as posições sociais, tão efêmeras, podem causar nas almas das pessoas, diante de seus semelhantes. Esquecem-se do que nos pode trazer o amanhã.
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ORAÇÃO DA MAÇANETA
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Não há mais bela música
que o ruido da maçaneta da porta
quando meu filho volta para casa.
Volta da rua, da vasta noite,
da madrugada de estranhas vozes,
e o ruído da maçaneta
e o gemer do trinco,
o bater da porta que novamente se fecha,
o tilintar inconfundível do molho de chaves
são um doce acalanto,
uma suave cantiga de ninar.
Só assim fecho os olhos,
posso afinal dormir e descansar.
Oh! a longa espera,
a negra ausência,
as histórias de acidentes e assaltos
que só a noite como ninguém sabe contar!
Oh! os presságios e os pesadelos,
o eco dos passos nas calçadas,
a voz dos bêbados na rua
e o longo apito do guarda
medindo a madrugada,
e os cães uivando na distância
e o grito lancinante da ambulância!
E o coração descompassado a pressentir
e a martelar
na arritmia do relógio do meu quarto
esquadrinhando a noite e seus mistérios
Nisso, na sala que se cala, estala
a gargalhada jovem
da maçaneta que canta
a festiva cantiga do retorno.
E sua voz engole a noite imensa
com todos os ruídos secundários.
-Oh! os címbalos do trinco
e os clarins da porta que se escancara
e os guizos das muitas chaves que se abraçam
e o festival dos passos que ganham a escada!
Nem as vozes da orquestra
e o tilintar de copos
e a mansa canção da chuva no telhado
podem sequer se comparar
ao som da maçaneta que sorri
quando meu filho volta.
Que ele retorne sempre são e salvo,
marinheiro depois da tempestade
a sorrir e a cantar.
que na porta a maçaneta cante
a festiva canção do seu retorno
que soa para mim
como suave cantiga de ninar.
Só assim, só assim meu coração se aquieta,
posso afinal dormir e descansar
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GANGORRA
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Quando eu desço, você sobe,
quando eu subo, você desce...
Lá fora dança a gangorra,
desde que o dia amanhece...
Desce e sobe, sobe e desce
num compasso sempre igual:
No centro, um ponto de apoio
prende a tábua horizontal!
Há borrões de sol vermelho
na loira manhã sem par,
e a gangorra não descansa,
sobe e desce sem parar...
A gangorra é como a vida,
nos movimentos que tece;
quando eu desço, você sobe,
quando eu subo, você desce...
Você, que ficou no alto,
não deve de mim sorrir;
você terá que descer,
quando eu tiver que subir!
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