Tendo em foco
as muitas formas de ser dos que conosco convivem, visitaremos hoje, sem a
pretensão de abordagem mais profunda, três tipos de pessoas: os espirituosos
irreverentes, os raivosos turrões e os catastróficos.
No folclore
nordestino existem alguns personagens altamente festejados no mundo da
“grossura”. Essas criaturas espirituosas e irreverentes sempre obedeceram a uma
regra: se a pergunta é burra, a resposta tem que ser um coice.
Dentre eles,
posso citar, embora não tenha conhecido nem um dos dois, seu Manduri, na cidade
de Patos das Espinharas (Pb), e seu Lunga, lá no Juazeiro do Norte (Ce). Certamente
que, em meio aos inúmeros fatos pitorescos que são contados e recontados, muitos
deles foram inventados por aí e atribuídos a essas figuras mitológicas da
“delicadeza”. Da forma como narram as piadas de que são protagonistas, forma-se
a ideia, talvez até equivocada, de que tenham sido pessoas extremamente
raivosas, brutas e permanentemente mal-humoradas. Realmente não sei se isso é
verdadeiro, mas foi dessa forma que sempre os imaginei. Contudo, apesar de todo
esse perfil de turrões e coiceiros que incorporaram, um lado bom eles trouxeram:
a produção de piadas para fazer o mundo achar graça e descontrair a vida.
Em outro
quadrante de nossa convivência, sem essa qualidade de pessoas espirituosas e
irreverentes, encontramos aqueles que, em nosso dia a dia, sem fazer graça
nenhuma, vivem esturrando e colocando fumaça pelas ventas, como se fossem os
dragões dos filmes de ficção ou das historinhas que nos contavam quando
crianças. Estas pessoas são
indubitavelmente doentes e simplesmente infelizes. Levantam-se da cama já raivosas
e mal-humoradas, talvez porque em seus pesadelos, brigaram sem parar durante a noite
inteira. Com certeza não vivem a vida. Estão naturalmente em conflito com tudo
e com todos, principalmente com os próximos mais próximos. São pessoas indiferentes
aos fulgores da vida, ao lado bom da convivência humana e aos encantos da natureza.
Em suas realidades interiores, a vida não tem vida. É uma masmorra onde é
proibido ser feliz.
Outro tipo é o
que navega sempre nos mares da catástrofe. Trabalhei com uma moça que trazia,
todo santo dia, uma novidade cruel em sua vida. Quando não era isso, ela sempre
achava que algo terrível ia acontecer. E sempre acontecia. Era uma profetisa das
tragédias. Nunca falava de algo venturoso, nem previa momentos de felicidade. Como creio na “lei de atração”, tenho certeza de
que a pobre coitada atraía a doença para o filho, a queda da avó, a batida do
carro do marido, o assalto a sua casa, e outros infortúnios de seu cotidiano.
Passei uns dez
anos sem vê-la. Num encontro recente, vi
que sua vida mudara para pior. De imediato ela foi abrindo sua caixa de
tragédias:
- Me sinto
velha e doente, meu pai morreu, estou desempregada, meu marido está preso, a
enchente invadiu minha casa...
Ouvi sua
ladainha silencioso e sem qualquer interesse. Depois aconselhei, mais uma vez,
a voltar o pensamento para coisas boas. Aquele modo de ser, contudo, se
transformou em uma doença crônica e sem remédio:
- Só pode ser
castigo, professor. Isso não muda. Só acontece o que não presta – disse-me com
voz trêmula e desesperançada.
Dei um jeito
de abreviar aquele papo, alegando estar atrasado para um compromisso, e sumi
dali o mais rapidamente possível.
Sem quaisquer
frescuras ou crendices vulgares, creio que essas energias nos afetam.
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