Do
livro: “Histórias e Causos que a Vida Contou”
Desde
os seis ou sete anos de idade, passou a ser chamado pelo apelido de
Brabo.
No
primeiro dia de escola, toda a meninada encontrou nele,
imediatamente, muitos motivos para gozações. Parecia um boneco de
brinquedo. Tinha metade da estatura dos outros, era exageradamente
franzino e sua cabeça parecia a de um macaquinho. Com aquele jeito
esquisito, seu primeiro apelido foi “monstrinho”, mas diante de
suas reações agressivas, os colegas adicionaram outro apelido que
veio a predominar definitivamente: Brabo. É que ele saía no braço
com meio mundo. Fosse quem fosse. Tivesse o tamanho que tivesse.
Havia, contudo, uma infinita desvantagem nisso. Não vencia um só
dos embates. Na maioria das vezes, no auge da brabeza, os garotos
erguiam-no do chão, sem qualquer esforço, e ele ficava balançando
no ar as duas perninhas, sem alcançar coisa alguma. Depois ia ele se
sentar, amuado, chorando e xingando, lá pelos recantos.
Os
dias se passaram, consagrou-se realmente como Brabo e, até hoje, por
volta dos cinquenta anos, quase ninguém sabe seu verdadeiro nome. No
transcorrer de todas essas décadas, certamente cansou-se de reagir
ao apelido e se tornou tão natural ser chamado assim, que a brabeza
do Brabo, para reagir a isso, sumiu. Se o chamarem por seu nome de
batismo, que também não sei qual é, com certeza não atenderá.
O
lado bom de tudo isso é que, apesar do apelido, o Brabo se fez um
cidadão pacato, absolutamente avesso à violência. Por outro lado,
o garotinho briguento dos tempos de escola não conseguiu mudar sua
compleição física. Continuou um magricela, um pedaço de gente,
com estatura bem inferior a um metro e meio.
Há
algum tempo, nosso personagem resolveu montar um bar a que deu o nome
de “Bar Paz e Amor”. Num pequeno salão de duas portas, instalou
prateleiras e balcão, comprou geladeira, sinuca, mesas, cadeiras e
adquiriu utensílios para servir tira-gostos. Ele atende lá na
frente e sua mulher cuida dos afazeres da cozinha. A todos ele faz
questão de dizer que o ambiente é familiar, em contradição com as
atitudes das figuras femininas que lá frequentam. O negócio tem
andado de vento em popa, mas o Brabo, vez por outra, tem que apelar
para a polícia vir restabelecer a ordem, em decorrência de algum
arranca-rabo.
Certo
dia, o tempo fechou lá no bar do Brabo e a urgência foi atendida
por uma guarnição da Companhia de Operações Especiais, conhecida
popularmente como COE, cujos componentes passam por uma seleção
rigorosíssima, como se estivessem procurando lutadores de vale-tudo.
Só pode fazer parte da corporação quem tiver corpo agigantado e
muita disposição na hora do quebra-pau. Vestem farda preta, são de
pouca conversa e, dependendo da valentia do abordado, deixam o
sujeito moído de peia.
A
guarnição atendeu com presteza ao chamado, mas um fato pouco comum
aconteceu. Ao entrar no bar, um daqueles gigantes de dois metros de
altura e massa corpórea de um mamute, foi logo fazendo a pergunta de
praxe:
-
Quem é o brabo daqui?
-
Sou eu! – respondeu firmemente o pobrezinho do Brabo, caminhando em
direção ao soldado.
Por
infeliz coincidência, empunhava um pedaço de taco de sinuca
que alguém houvera quebrado na hora da confusão e que ele acabara
de apanhar do chão para jogar no lixo. O brutamontes não quis papo.
Sentiu-se ameaçado e desceu-lhe a mão aberta no tronco da orelha. O
pobre do Brabo foi estatelar-se a uns oito metros de distância,
completamente nocauteado, lá no meio da rua.
-
Comigo, brabeza é na porrada! Mais algum brabo por aqui? - arrematou
desafiante o policial.
Quem
era doido de responder? Alguns presentes, porém, com muito jeito,
apressaram-se em desfazer o lamentável equívoco e correram para
acudir o coitado do Brabo que, totalmente zonzo, procurava
identificar em que mundo se encontrava.
Desfeito
o tumulto, verificou-se que os baderneiros responsáveis pela
confusão já estavam muito longe e o comandante da patrulha
entabulava, comovido e prestimoso, um insistente pedido de desculpas
pela violenta trapalhada.
Vida
afora, o Brabo se fez manso, mas infelizmente continua a carregar e a
sofrer o peso da falsa brabeza de seu apelido.
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(*)
Escritor, poeta, passageiro do tempo e da agonia... e não sei mais
o quê.
o quê.
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